Essência e Ground – David Boadella

Essência e Ground – David Boadella

Contextos culturais da espiritualidade

Espiritualidade, mistério e religião A história da espiritualidade é tão antiga quanto a cultura humana, existe desde que o primeiro homem da Idade da Pedra enterrou seus mortos e pintou símbolos ritualísticos nas paredes de suas cavernas subterrâneas.

A palavra espírito vem da palavra respiração e está relacionada a inspiração.

O quinto elemento dos gregos era conhecido como “aitheros” e era uma energia fina mais sutil que o ar. Ser espiritual era estar em contato com esta essência sutil do cosmo e de si mesmo.

O contato com o próprio coração e com essa essência sutil, não era um processo que podia ser alcançado por meios intelectuais, ou pelo processo consciente do pensar do cérebro, era um mistério. O filosofo Gabriel Marcel fala de uma polaridade entre o que ele chamou de nível do “problema” da experiência e o nível do “mistério” que está subjacente ao problema. A possibilidade de cura vem deste nível profundo.

O significado original da palavra religião, que vem do latim religere, era reconectar ou fazer de novo contato com um nível mais profundo do ser. Em meus estudos de religião e natureza no nascer dos anos sessenta (Boadella, 1956, 1958), defini três níveis que podem ser encontrados em todas as religiões mundiais: os chamei de exotérico, esotérico e níveis essenciais. No nível exotérico podemos encontrar as formas exteriores da religião, que com o passar dos tempos frequentemente perdem contato com a mensagem de seu fundador e tornam-se incrustadas com dogmas e fundamentalismos que são anti-humanísticas em espírito.   Podemos pensar na Inquisição Católica, no fanatismo sionista ou no fundamentalismo Islâmico e veremos a degeneração de uma tradição espiritual originalmente criativa em um movimento político rígido que espalha perseguição e prega violência e uma ética distorcida, transformada em uma guerra santa contra infiéis, não importa quem seja. A cena política atual da Irlanda, Bósnia e oriente Médio nos fornece ampla evidencia dos problemas criados e alimentados pela degeneração da religião quando a forma exotérica perdeu contato com sua mensagem fundamental ou pela exacerbação das diferenças religiosas.

O mistério também pode ser distorcido em “esotericismo”, o desenvolvimento de práticas exóticas de aumento de níveis de energia, que são atalhos ao desenvolvimento da consciência e são associadas com a formação de grupos fechados com tendência a desenvolver cultos e seitas.

Mais tarde neste artigo, olharemos para exemplos modernos. Alguns podem ser encontrados em situações extremas desenvolvidos pelos primeiros cristãos do período Gnóstico.

O aspecto essencial da religião é o coração de sua espiritualidade. É sempre muito simples, é uma mensagem para todos os povos, é relacionado ao coração, é conectado ao amor e a compaixão, e tem como resultado unir e não separar as pessoas. Recentemente, Hans Kung liderou a formação de uma fundação para uma Ética Global, na qual representantes das maiores religiões mundiais se uniram e criaram uma ética de fundamentos centrais comuns que todos pudessem subscrever.

Esta Ética foi aceita pelo Parliament of World Religions (Kung, 1955) e reconfirmada na Declaração da UNESCO sobre a Contribuition of Religion to the Culture of Peace, em Barcelona em Dezembro de 1994.

Nos últimos sete anos, estudei e fiz minha própria releitura de cerca de trinta textos fundamentais das maiores tradições espirituais. Eles representam o que chamo tradição “Terra Luz”, a conexão entre insights espirituais, simbolizados pela “luz” e realidade material, simbolizada pela” Terra”. O que é mais impressionante em todos estes textos é a semelhança básica de sua mensagem, mesmo quando as formas culturais e a expressão individualizada da mensagem são altamente divergentes.

Tradições formativas e deformativas: o trabalho de Adrian van Kaam

Nos últimos cinquenta anos, um projeto maravilhoso para estudar a espiritualidade foi desenvolvido pelo Professor Adrian van Kaam, originário da Holanda. Este projeto por muitos anos recebeu suporte do Institute of Formative Spirituality fundado por van Kaam na Universidade de Duquesnes, em Pittsburgh, EUA.

Van Kaam mostrou a relação existente entre os ensinamentos formativos tradicionais dos movimentos religiosos mundiais e os insights desenvolvidos pelas ciências humanas e pela Psicologia Transpessoal. Ele percebeu que as tradições espirituais formativas estão abertas ao nível do “mistério” da experiência humana e por isto são capazes de irem mais profundamente, do que o puramente humanístico ou o puramente transpessoal. Van Kaam também assinalou os aspectos unificadores destas tradições formativas (Van Kaam, 1894-1955).

Van Kaam estudou as condições que levavam estas tradições a se deformarem e perder o contato com suas origens simples e compassivas e tornarem-se distorcidas. A consciência dos aspectos distorcidos dos ensinamentos religiosos foi uma das razões que levou a razão “cientifica” moderna a rejeitar e desconfiar de toda herança religiosa da humanidade.

O ópio do povo, o futuro de uma ilusão e a psicologia das massas do fascismo

De Spinoza e Nietzsche a Marx, Freud e Reich

Um dos primeiros pensadores ocidentais que falou sobre o lado distorcido das religiões foi Baruch Spinoza. Em consequência foi amaldiçoado pelos defensores da tradição judaica do seu tempo (Spinoza,1989) e visto como um ateu. Spinoza foi um precursor de Nietzsche, Marx e Freud. Ele era, de fato, uma pessoa muito desenvolvida espiritualmente como revelará prontamente uma leitura cuidadosa e não preconceituosa do seu livro “Ética”. Nietzsche defendia o aspecto conectado a vida das religiões, vivamente expressos nos ensinamentos e vida de Zarathustra (Ellenberger, 1970b) e criticou o aspecto moralizador das religiões vistos como contrários a vida.

Entretanto Nietzsche tornou-se erroneamente conhecido com a noção de que Deus está morto, ou seja, sem nenhum significado para o homem moderno.

Karl Marx, um humanista que lutou contra a alienação do homem submetido ao patriarcado e ao capitalismo, tinha consciência deste lado distorcido da religião e a considerava como o ópio do povo, como um tranquilizante para a dor, a promessa de um paraíso não terrestre, existindo em uma fantasia longínqua. Sigmund Freud (1927) escreveu um livro completo sobre “O Futuro de uma ilusão”, no qual fala como ideias religiosas distorcidas podem estar ancoradas em nosso inconsciente e serem usadas para apoiar nosso sistema de defesas. Wilhelm Reich (1945) estudou o mau uso do misticismo religioso na Alemanha Nazista, e viu as conexões entre repressão autoritária apoiada por dogmas religiosos e a psicologia de massa do fascismo.

Estes grandes filósofos e psicólogos compreenderam corretamente o lado distorcido da religião, mas nenhum deles foi hostil aos aspectos essenciais da espiritualidade.

A tradição bioespiritual na espiritualidade ocidental

A tradição formativa da espiritualidade no Ocidente existiu frequentemente de forma escondida e foi perseguida pela igreja ou poder político. Suas implicações revolucionárias com possibilidades de mudar os estilos de vida humana eram bem conhecidas pelas autoridades.

A capacidade para enriquecimento e fertilização recíproca entre as tradições Cristãs, Judaicas e Islâmicas, alcançaram seu auge durante os primeiros anos da Idade Média na Espanha, como relata Gunther Scholem (1987), para logo mais tarde ser destruída e reprimida, com consequências trágicas para o desenvolvimento da Cultura Ocidental, como a destruição Católica da cultura dos Catharos que culminou com a queimada dos defensores da capela de Montsegur em 1244 A.D.

A tradição espiritual ocidental começou com os ensinamentos sobre a inteligência do coração no Egito Antigo (Schwaller de Lubicz,1977) e os ensinamentos não dualistas e ecologicamente corretos de Zarathustra na Pérsia (Mehr,1991). A partir de então foram desenvolvidos pela escola de Pitágoras na Grécia (Boadella, 1998) e levados adiante por cerca de mil anos até a época de Damascius e Proclus no quinto século depois de Cristo. Ammonia Saccas (1988), o professor iluminado de Plotinus de Alexandria, foi também o professor de Origen (12), um dos mais criativos e íntegros do Cristianismo primitivo. Estas duas tradições foram transmitidas através de Augustine no Ocidente e através de Gregory de Nyssa no Oriente e integrados na pessoa de Dionysus, o monge sírio (Dionysius the Aeropagite,1980). Esta tradição veio para o Ocidente, do outro lado da Ásia, através do filósofo irlandês, John Scotus Eriugena (1971-1981), que viajou pelo vale do Reno e inspirou várias gerações de místicos do Reno, inclusive Hildegard von Bingen (1987), um dos primeiros filósofos a falar da integração corpo-mente na Literatura Alemã e Johannes Eckart (1944), uma figura central na história da espiritualidade ocidental. Ele foi influenciado pela Cabala, pelo Sufi do Islã, e também por franciscanos; foi ligado a pessoas como Robert Grossteste (1970) e Roger Bacon (1929) no século treze, figuras fundamentais não somente em relação à espiritualidade como também ao início da ciência ocidental.

Eckart e Eriugena prepararam o caminho para Nicholas de Cusa, uma figura fundamental, nascido em 1401 que ensinou a teoria heliocêntrica uma geração antes de Copérnico. Cusa foi uma figura chave que inspirou a Renascença italiana e reviveu o neoplatonismo não dualista e o hermeticismo afirmativo da vida (de Cusa,1970). Giordano Bruno foi o herdeiro desta herança tripla: o hermeticismo, o neoplatonismo e a Cabala Cristianizada. Estava mais de duzentos anos à frente de seu tempo e recebeu sentença de morte por heresia, da Igreja Católica em 1600 AD (Bruno, 1976).

Giordano Bruno é uma figura que transcendeu o tempo. Inspirou Jacob Boehme e os pietistas alemães que precederam Imannuel Swedenborg como também Goethe, Leibniz, Spinoza e Schelling (1984) e no século passado, Wilhelm Reich (1952), o pai da psicoterapia corporal, como também Eugen Dreweman (1922), o teólogo yunguiano que escreveu proficuamente sobre a consciência dos aspectos políticos da espiritualidade.

Ciência, Cientificismo e a morte do Self

Ciência significa conhecimento. Existe a ciência natural e a ciência humana ou ciência espiritual, também conhecida como a disciplina respeitável do” Geistesswisssenschaft” na língua alemã. A ciência mais nova no Ocidente, a exploração pitagórica das relações existentes entre os sons musicais e o tamanho das cordas na guitarra (kithara) era parte de visão geral do homem, compreendido como um microcosmo conectado ao macrocosmo (Boadella, 1998). Esta visão foi revivida e redescoberta no Renascimento. Os gigantes do século dezessete, homens como Johannes Kepler, Isaac Newton, Robert Boyle, eram fascinados pelo mistério que existia atrás dos problemas com que se defrontavam, quer fosse o movimento dos planetas, a força gravitacional, ou a combustão da matéria em interações químicas. O conhecimento das forças sutis escondidas na natureza era considerado tão importante como o conhecimento das propriedades exteriores e mensuráveis da natureza. Kepler foi em certo sentido, o último dos antigos e o primeiro dos modernos como Koestler (1988) mostrou em seu trabalho épico sobre o nascimento da astronomia moderna, “The Sleepwalkers.”

Newton era fascinado pela alquimia e os numerosos trabalhos (scholia) que escreveu para acompanhar sua descrição das leis físicas da gravidade, estariam classificados na atualidade inquestionavelmente como “esotera.” O conhecimento esotérico é de fato a mãe da ciência. (Dennis, 1992).

As pesquisas de Galileu sobre a dinâmica dos corpos em movimento, que derrubou os dois mil anos da velha dominação estreita da cosmologia aristoteliana, lançaram as bases da física moderna.

A partir de então as quantidades eram consideradas como objetivas e as qualidades como propriedades da percepção, não como aspectos da natureza. Quando Descartes dividiu a natureza em matéria e mente, res extensa e res cogitans, a consciência foi reduzida como sendo uma propriedade somente do ser humano e todo o resto, incluindo os animais e o corpo humano foram vistos como máquinas. O cosmo foi despiritualizado e a estrada para o cientificismo estava aberta.

Cientificismo em oposição à Ciência é a visão de que somente o que pode ser medido, objetivo, somente o que é empírico aos cinco sentidos e suas extensões através de instrumentos de medição (como telescópios, microscópios, espectroscópios e tudo mais) é real. O mundo interior, o fabrico interior do cosmos tornou-se visto como um lugar de fantasia subjetiva, de imaginação, um reino aberto somente aos poetas, pintores, sonhadores românticos e escritores de ficção.

No início do Renascimento era possível para uma pessoa como Leonardo da Vinci mostrar excelência nas Artes e nas Ciências como na época dos antigos gregos. Uma figura como Wolfgang Goethe, que foi poeta e o fundador da ciência da morfologia, reflete a abordagem conectada a natureza antes da bifurcação, ainda que ele tenha vivido um século depois.

Emmanuel Kant que lutou contra a forma reducionista de compreender o universo, reduzido ao que podia ser conhecido através dos sentidos, dividiu o mundo em fenomenal e nouminal, o primeiro podia ser conhecido, o segundo não. A essência atrás das aparências nunca poderia ser apreendida. Nossa compreensão mais próxima disto seria nosso senso de moralidade e nosso senso de estética. Kant buscou resgatar a importância do valor num mundo empírico fenomenal do qual o valor tinha sido excluído. Para o cientificismo, os átomos não têm significado, o vácuo é vazio, a matéria é cega. Kant lutou com duas partes de si mesmo, uma preparava o caminho para a visão de um mundo moderno e a outra ainda fascinada pela procura do indefinível nouminal.

Seu alter ego foi Immanuel Swedenborg, uma geração mais velha que ele. Swedenborg foi um renomado cientista de sua época e uma pessoa aberta a sua própria espiritualidade; ele tinha dons parapsicológicos. Kant devorou todos os livros de Swedenborg (1984), escreveu uma carta admirável sobre o mesmo, e então o atacou e ridicularizou em seu primeiro livro “The dreams of a Ghost Seer” (Kant, 1992), mas adotou muitos dos principais insights de Swedenborg em sua aula inaugural sobre “Mundus Intelligibilis e Mundus Sensibilis” (Kant 1984).

A rejeição de Kant a Swedenborg tornou o cientificismo respeitável e a espiritualidade uma questão privada ou reservada aos tradicionais detentores dos valores, a Igreja.

Um século mais tarde a teoria da evolução foi criada por Charles Darwin e Alfred Wallace.

A teoria da evolução foi considerada como mais um ataque a qualquer crença em uma suposta ordem do Cosmos. O homem, como o universo, era o produto de forças cósmicas operando ao acaso. O fato de que Wallace era um ardente espiritualista, na tradição Swedenborguiana, estava além de qualquer argumento: espiritualidade era somente uma questão privada, de opinião pessoal. O caminho estava aberto para o movimento da morte de Deus e dentro do existencialismo da morte do Self.

Veremos mais tarde como estas questões aparentemente resolvidas no universo poskantiano, são temas atuais que fervem dentro das controvérsias das novas ciências da consciência.

Movimentos da nova era, cultos e seitas

Num mundo onde Deus está morto, o Self é um conceito pessoal, a Igreja está vazia e o Cientificismo tornou-se a nova religião, foi criado um vácuo onde floresceram os movimentos da nova era, que oferecem uma mistura superficial de metodologias pseudo espirituais para a auto realização.  Estes incluem desde aconselhamentos astrológicos, leituras de Tarot, ensinamentos canalizados transmitidos por indivíduos supostamente escolhidos por entidades desencarnadas, até estrondosos cursos dados nos métodos mais espetaculares já encontrados por ocidentais nas religiões do longínquo Oriente. Surgiram novos profetas, que mesmo sendo ocidentais são conhecidos pela palavra indiana “guru”, que significa professor. Surgiram novas estruturas de poder, nas quais sistemas de crenças rapidamente se cristalizaram em cultos fundamentalistas e grupos que compartilhavam estas crenças desenvolveram um tipo de gueto espiritual e degeneraram em seitas. Temos aqui o desenvolvimento de um novo tipo de psicologia de massa do fascismo, não mais como no caso do Nazismo, um Credo do Estado, mas um tipo de totalitarismo sutil, ou menos sutil, tipo líder de seita ou culto de herói. Em meus artigos “Violência na Terapia” (Boadella, 1980 a) e “A morte do Ego” (Boadella, 1994b) que mais tarde apareceram no livro “Toxic Terapy, religions and cults” (Boadella,1994), estudei alguns exemplos específicos destes processos, e fui convidado em 1990 para a Casa dos Lordes em Westminster para dar uma conferência sobre “Cultos e Seitas” na qual foram descritos os aspectos psicopolíticos destes movimentos distorcidos.

A presença de tais forças, aparentemente antiquadas mas que estão fortemente presentes nos contornos da cultura estabelecida tornou-se um sério obstáculo a sobrevivência das tradições espirituais genuínas, fora da moldura das religiões exotéricas. Em nenhuma outra parte isto tornou-se mais problemático do que na área da cura.

Cura ou Terapia?

Ao nascer da cultura ocidental cura e terapia eram a mesma coisa. Curar significava tornar inteiro. Psicoterapia significava o cuidado da alma, como explanei cuidadosamente em meu artigo “Attunement and the care of the soul” (1998a). A tradição de Hipócrates, “Mente sã em corpo sã” (Mens sana in corpore sana) foi uma tradição bioespiritual que procurava cuidar do bem estar espiritual do paciente tanto quanto do seu bem estar físico e mental.

A medicina moderna tornou-se altamente especializada em abordagens como cirurgia ou tratamentos químicos baseados no que Rene Dubois chamou a “pílula mágica”, a pílula farmacológica. Aspectos espirituais e psicológicos não são incluídos.

A medicina complementar e holística cresceu neste vácuo criado pela Escola de Medicina. Como os poderes políticos reagiram a isto é um estudo sociológico fascinante.

Nos EUA tornou-se politicamente perigoso para um médico prescrever alimentos saudáveis. Na Alemanha nazista, o curador natural, o “Heilpraktiker”, era aceito porque Hitler estava cercado por conselheiros esotéricos abertos a tais práticas alternativas.

Paradoxalmente as leis nazistas sobre a cura natural são as mais liberais na Europa. No ano passado na Áustria, foi promulgada uma nova lei que considera a prática do Healing feita por profissionais não médicos, como crime. Enquanto isso a Organização mundial de Saúde reconhece o valor das práticas de cura remanescentes de culturas pré-modernas (tais como a tradição dos médicos descalços na China) e as valoriza, dando-lhes suporte. Muitos destes métodos tradicionais de cura, longe de serem “nova era”, preservaram alguns dos melhores insights de milhares de anos de experiência das tradições espirituais holísticas, como o sistema de acupuntura na China, a Medicina Ayurvedica na Índia, ou a tradição xamanista da Ásia, África ou da América pré-colombiana.

Henry Ellenberg (1970a) em sua monumental história da psiquiatria dinâmica devotou seu primeiro capitulo de 50 páginas á ancestralidade da psiquiatria dinâmica na compreensão xamânica da integração corpo- mente- espírito. Ele escreve em seu parágrafo de abertura:

“Embora a investigação sistemática da mente inconsciente e da dinâmica da psique seja aparentemente nova, as origens da Psicoterapia Dinâmica remontam a uma longa linha de ancestrais e precursores. Certos ensinamentos filosóficos ou médicos do passado, como também certos métodos antigos de cura oferecem surpreendentemente um alto nível de insights considerados as mais recentes descobertas no reino da mente humana” (p1).

Ellenberg abre espaço para a descrição da noção pré-moderna do que chamaríamos de “neurose” e que eles relacionavam com a “perda da alma”.

“Entre todas as teorias de doenças primitivas”, ele escreve “provavelmente nenhuma é mais estranha para nós do que a ideia da perda da alma. Nada está mais distante dos nossos princípios de tratamento de um paciente do que a restauração de uma alma perdida. Contudo, se ignoramos o elemento cultural e procuramos pelas raízes dos fatos encontraremos uma raiz comum entre estes conceitos primitivos e os nossos”.

Entre o anormal e o paranormal: as raízes dos fatos na história da psiquiatria dinâmica

Se alguém estudar as origens da terapia psicodinâmica moderna nas décadas que antecederam Sigmund Freud, encontrará um surpreendente nível de integração na compreensão da saúde física, mental e espiritual e a doença. A psicanálise, como mostrei em artigos anteriores (Boadella, 1997) surgiu a partir da análise psicofísica de Pierre Janet. Janet e Freud foram herdeiros do que Ellenberg chama de uma continuidade inquebrantável do mesmerismo, do hipnotismo até a psicoterapia moderna.

Franz Anton Mesmer, o fundador do mesmerismo, e o criador do caminho da psicoterapia dinâmica moderna, foi fortemente influenciado por Immanuel Swedenborg. Os estudos desenvolvidos pelos primeiros hipnotizadores, seguidores de Mesmer, sugerem que o que sob um aspecto podia ser considerado como um distúrbio psicológico ou anormalidade, sob outro ponto de vista poderia ser compreendido como expressão de uma habilidade paranormal. Muitos dos primeiros clientes da psicoterapia eram o que atualmente chamamos de “médiuns” e eram naquela época chamados de “sensitivos”. Sensitivos eram pessoas que estavam abertas a formas super sensórias de comunicação, tais como clarividência, ou que tinham contato, através de habilidades paranormais, com outras realidades além do mundo material. Swedenborg, o primeiro fenomenologista, e o primeiro grande pesquisador dos sonhos, registrou tais experiências em muitos relatos. Nesse momento estavam lidando com níveis de consciência que apareciam em pacientes hipnotizados. O que fizeram os primeiros psicoterapeutas com estes níveis de realidade?

O que encontraremos se explorarmos este período da segunda metade do século dezenove é que o estudo da psicologia e o estudo da parapsicologia estavam entrelaçados em uma espécie de continuo. Havia um entendimento de que existiam outros níveis de realidade e que os seres humanos podiam ter acesso direto aos mesmos, exatamente o inverso do que Kant ensinou quando colocou o nouminal fora de alcance.

Os primeiros pioneiros da compreensão psicodinâmica, Janet, Richet, Myers, estavam intimamente relacionados com filósofos chaves da época como William James (1982) e Henri Bergson (1991) que exploraram a interface corpo-espirito e com biólogos descendentes da tradição de Goethe, como Hans Driesch (1908). Gustav Fechner, o fundador da psicofísica, pertencia a esta tradição como também um grande número de médicos tais como William Crookes, Johann Zollner e Oliver Lodge. Todos esses indivíduos estavam preocupados com o estudo da parapsicologia e pesquisa psíquica e eram particularmente abertos a dimensão espiritual da existência.

Frederick Myers (1903) estudou estados alterados da consciência muitas décadas antes da morte de Pierre Janet em 1947. O nascimento do século atual testemunhou uma divergência crescente na compreensão da integração mente, corpo e espírito. O estudo do corpo tornou-se o domínio da medicina moderna e dos vários tratamentos físicos paramédicos. O estudo da mente tornou-se a prerrogativa da psicoterapia, que lutou para distanciar-se de suas origens xamanicas e parapsicológicas. A abordagem ao espírito ficou reservada ás tradições religiosas ou tornou-se o objeto de caça das seitas e cultos da nova era. A psicoterapia teve de defender suas fronteiras de todas as formas, não somente contra o corpo como também da sua interface com esotera.

Esotera foi não somente a mãe da ciência, mas a mãe da psicoterapia. Todos nós conhecemos as defesas e distúrbios profundos que estão associados com o matricídio.

Apesar desta tendência para estas novas formas de divisão, na parte II deste artigo, mostrarei como a espiritualidade manteve seu lugar dentro da psicoterapia, embora de forma reduzida.

Parte II: Espiritualidade dentro das principais correntes da Psicoterapia

Sentimentos oceânicos e o futuro de uma ilusão

Embora Freud reconhecesse a realidade do que chamou de sentimentos e anseios oceânicos, sua tendência era de considerá-los como um reviver regressivo da união original com a mãe.

De acordo com Henri Ellenberg: “A filosofia freudiana era uma forma extrema de positivismo, que considerava a religião como perigosa e a metafísica como supérflua. Em 1907 (em um artigo sobre “Zwangshandlungem und Religionsubung” no Zeitschrift fur Religionpsychologie, nº 1), Freud comparava os sintomas obsessivos compulsivos dos neuróticos com rituais e credos religiosos e concluiu que a religião era uma neurose obsessiva universal e a obsessão uma religião individualizada. Vinte anos mais tarde no livro “O Futuro de uma ilusão” Freud (1927) definiu a religião como uma ilusão inspirada na crença infantil de um pensamento onipotente, uma espécie de narcótico que impedia o exercício livre da inteligência e algo a que o homem deveria renunciar” (Ellenberg, 1970a. P.525).

Vemos que aqui Freud reconhecia claramente os efeitos distorcidos de tradições religiosas deformadas que se tornaram rígidas e cristalizadas. O que Freud não considerou foi o lado formativo das tradições espirituais. Ao jogar fora junto com a água do banho a compulsão obsessiva do lado exotérico da religião, ele também jogou junto o bebê do coração essencial da espiritualidade humana.

Esta omissão foi retificada e reconhecida por Otto Kernberg, o Presidente Eleito da Associação Internacional de Psicanálise em um discurso no Congresso do Conselho Mundial de Psicoterapia em Viena, em 1996. Kernberg considerou que Freud reduziu os impulsos religiosos e espirituais a produtos da neurose, eliminando quaisquer outras bases para princípios éticos que não fosse a racionalidade. A religião de acordo com a perspectiva freudiana, era ilusão.  De acordo com Kernberg, a conduta ética e as ações compassivas derivavam não da racionalidade do intelecto mas do nível espiritual essencial da pessoa. Kernberg afirma que a religião em seus aspectos formativos, lida com os aspectos éticos essenciais da existência humana e oferece um sistema de valor universal que encoraja sentimentos de responsabilidade, cuidado e compreensão compassiva, respeito pelos direitos dos outros e tolerância para com as diferenças. Com este discurso Kernberg (1996) reabriu a porta que a psicanálise tinha fechado para a inclusão da espiritualidade dentro da psicoterapia como uma área central de foco e preocupação, como uma fonte potencial de cura das feridas mais do que uma defesa compulsiva que deveria ser analisada.

Unidade, influencia cósmica e a coragem do coração

Na Psicologia Individual de Alfred Adler certos princípios eram enfatizados como fundamentais. Um desses princípios era a unidade, enfatizando que o ser humano era uma unidade integrada de corpo, mente e espírito. Um segundo princípio foi o de “Zielstrebigkeit”, a ênfase era de que o ser humano é motivado pela procura de “um sentido da vida” (o título de um dos livros de Adler) e a busca de realizar valores. Um terceiro princípio, foi o princípio da influência cósmica, enfatizando a interconexão entre o indivíduo e o cosmo. Um quarto princípio, foi o que Adler chamou de “mut”, que relacionava com a palavra grega timo. Timo significa a coragem do coração, uma qualidade que os gregos consideravam parte da essência da alma.” Despertar o timo em uma criança deveria ser a preocupação básica do educador, como também do psicoterapeuta, não importando se o paciente é uma criança ou adulto” (Ellenberg, 1970a, p.609).

Em 1932, Adler, juntamente com o pastor alemão Ernst John de Stieglitz, de Berlin, escreveu um livro sobre “Religion und Individual Psychologie” (Adler & John 1932). Este livro, logo que surgiu, foi banido e destruído pelo partido nazista.

Viktor Frankel foi um proeminente adleriano que sofreu, mas sobreviveu a experiência de ser confinado em um campo de concentração. Ele desenvolveu o que chamou de

“Logoterapia, (40), a terapia dos significados e valores, a partir da conexão que tinha com um sentimento profundo de significado interior que o ajudou e a outros companheiros do campo a sobreviver, emocionalmente, moralmente e espiritualmente a esta experiência. Na Logoterapia de Frankel não é difícil perceber a influência de Adler no que tange a ênfase na importância em cultivar o timo e a coragem do coração.

Stanley Keleman (1974) estudou no Instituto Alfred Adler em Zurich e desenvolveu mais tarde o conceito de processo formativo e de auto formação que são uma das maiores fontes de inspiração dentro das psicoterapias corporais.

O Arquétipo do Self e as energias do corpo sutil

Em 1971 Rudolf Otto publicou seu livro “The Idea of the Holy”, uma grande contribuição a psicologia da religião. Otto definiu uma experiência fundamental, básica a toda experiência religiosa, que chamou de “o numinoso”. O numinoso estava relacionado a um sentimento de admiração frente a criação e um sentimento de confrontação com um valor insuperável.

De acordo com Henri Ellenberg, Jung tomou seu conceito de numinoso de Rudolf Otto e relacionou com seu conceito de arquétipo. Dionysus, o Aeropagita, no século quinto D.C., que como vimos foi uma figura chave na formação da tradição espiritual do ocidente, usou o termo arquétipo para denominar as qualidades essenciais de nossa experiência. Yung o reconheceu como uma das fontes de onde retirou o termo arquétipo.

Jung distinguiu entre a persona (a manifestação exterior da pessoa), a sombra (o inconsciente reprimido) e o arquétipo do Self em busca de individuação. Em seus seminários sobre Zarathustra nos anos noventa (Jung 1934), ele se abriu aos insights da tradição ocidental sobre o corpo sutil, como foram transmitidos pelos neoplatonistas particularmente Proclus. A tradição do corpo sutil postula a existência de um spectrum ou continuum de estados do ser que vão desde o puramente físico, através de estados intermediários dos campos de energia vivenciados como corpos sutis até o Self essencial.

O desterro espiritual e a reconexão espiritual

Otto Rank (1939) é bastante conhecido por ter ido além de Freud ao relacionar a neurose aos traumas do nascimento. Rank é o pai fundador da psicologia pré e perinatal, uma ciência interdisciplinar. É menos conhecido o fato de ter descrito a neurose como uma forma de fragmentação que cria um desterro espiritual e nos desconecta das nossas raízes espirituais. Se a neurose é compreendida como um tipo de desespero ao ser confrontado com o vazio, então a religião em seu significado primordial de reconexão significava exatamente o oposto. Rank escreve em seu último livro, “Beyond Psychology”, escrito em 1939, ano em que morreu, e que foi publicado dois anos mais tarde:

“Ao redescobrir em nossas vidas, valores espirituais perdidos ou escondidos, que dão sentido a nossa existência biológica e social, buscamos mostrar como a personalidade individual e sua cultura, ambos emergem da mesma necessidade de imortalidade”.

Conquanto Freud enfatizasse a existência do id como reservatório das nossas necessidades primitivas, o ego como o lugar da racionalidade e o superego como a voz da cultura, Rank introduziu, o que ele chamou de “terceiro princípio”, que combina elementos racionais com irracionais numa visão do mundo baseada no supernatural.

Rank associa este princípio com uma “necessidade vital” por valores espirituais e vê esta necessidade como muito importante que embora negada ou reprimida em nossa civilização altamente mecanizada, era sentida no homem primitivo através do pensamento mágico.

Relações objetais, psicologia do self e o ciclo dinâmico do ser

A teoria das relações objetais, originária da psicanálise, enfatizou a importância das relações humanas no desenvolvimento da personalidade. Para ela o desenvolvimento da capacidade de amar depende da segurança afetiva promovida por uma relação primária amorosa e cuidadosa do self. A teoria das relações objetais se constitui em uma exploração das bases essenciais do amor no ser humano que se expressa em sua capacidade de relacionar-se. Em nenhum outro lugar isto ficou mais claramente enfatizado do que nos escritos psicodinâmicos de Harry Guntrip (1971), um dos maiores terapeutas da Escola Britânica das relações objetais.

Harry Guntrip teve uma influência central em Frank Lake, um psiquiatra cristão que desenvolveu um modelo de saúde psicodinâmico baseado nos quatro aspectos da personalidade de Cristo. Ele os chamou de ser, bem-estar, poder e comunicação. O trabalho de vida de Lake foi a criação de uma escola psicodinâmica muito ativa, que chamou de “teologia clinica” (Lake 1966). Ele reclamava que psiquiatras e teólogos não entendiam seus escritos, mas as donas de casa adoravam. O uso que Lake fez do arquétipo de Cristo como um símbolo do ground essencial da personalidade, seu coração espiritual, ressoava com o uso que Jung fez do arquétipo em seu livro “Aion” (Jung 1955) ou Reich em seu livro “O assassinato de Cristo” (Reich, 1952).

Infelizmente a forma de teologia que Lake adotou era uma forma restritiva do Anglicanismo e alguns acharão de algum modo, sua forma de associar questões teológicas e clinicas muito opressiva, conquanto seus insights em psicodinâmica, caracterologia e vida pré-natal sejam brilhantes (Lake também se inclinava a tradição descendente de Otto Rank).

Uma teologia muito mais libertadora e revolucionária, rica em insights psicodinâmicos sobre a polaridade entre confiança básica e angustia aterrorizadora, encontra-se no trabalho do teólogo psicoterapeuta Eugene Drewerman (1992), um pastor alemão com uma contribuição prolífica e acurada consciência política e social. Drewerman, temido pela Igreja Católica, foi banido da mesma por ensinar em seu nome. Ele foi um dos principais palestrantes no primeiro Conselho Mundial de Psicoterapia em Viena, 1996.

Andres Nino, psicólogo da Universidade de Harvard, em um artigo sobre a Restauração do Self, Volume 27 do Jornal de Psicoterapia, descreveu a importância da psicologia do self de Heinz Kohut para o tema da transcendência. Na compreensão de Nino, Kohut, “focou no self, o significado da busca de realização de valores e ideais, representada no “Homem Trágico” e o papel crucial representado pelas relações empáticas na restauração do self, sofrido pelo vazio interior, isolamento e falta de realização”. Nino escreve:

” O sistema psicológico de Kohut afirma que o self, que é o centro do universo psicológico, é composto de dois componentes principais: um polo de ambição, do qual emana a principal motivação para poder e sucesso e um polo de valores e ideais internos”, que Nino relacionou com a luta por sobrevivência espiritual. Kohut identificou o self nuclear com “aquele continuo no tempo que contém os ideais e valores mais duradouros do indivíduo, junto com seus propósitos, ambições e metas mais profundamente enraizadas”(Nino,1990).

Vida e religião: contato psíquico e correntes vegetativas

Wilhelm Reich, como já vimos, foi um crítico feroz das tradições religiosas distorcidas e deformadoras, como Spinoza, Nietzsche, Freud e Marx. Em suas investigações do sistema energético humano, Reich tornou-se cada vez mais envolvido no processo das correntes vegetativas nos tecidos de seus pacientes e observou que o contato psíquico e a capacidade de conectar-se estava enraizado no livre fluir da libido. Freud usou a metáfora da ameba expandindo no prazer e contraindo na ansiedade, Reich apropriou-se disto e investigou, olhando no microscópio as pulsações plasmáticas dos organismos unicelulares, e que mais tarde chamou da “antítese básica da vida vegetativa”.

Suas pesquisas o levaram a investigar as raízes do homem na natureza e a interface entre os processos biológicos e o os processos cósmicos, mediados pela atmosfera que era um fator chave tanto nos processos biológicos dos organismos vivos como também um envelope para a terra com uma história cósmica e astrofísica. As investigações da energia cósmica levaram Reich a conscientizar-se da inter-relação entre o que as religiões estudavam como “Deus”, os físicos estudavam como “éter” e o que ele estudou como energia cósmica (Reich,1949).

Na época que desenvolveu a vegetoterapia, o fundamento de todas as formas posteriores de psicoterapia corporal que surgiram mais tarde, um dos primeiros colegas de Reich foi Ola Raknes, um filósofo norueguês, linguista e psicanalista, que estudou os conceitos de experiência religiosa de William James(1982) e concluiu em ensaio importante apresentado na 5th Scandinavian  Psychology Conference (Raknes,1970), que as correntes vegetativas que apareciam durante o trabalho psicoterapêutico corporal estavam relacionadas aos sentimentos oceânicos descritos por Freud e a muitas das experiências de pessoas ligadas ao caminho espiritual que tinham seus corpos sensibilizados para perceber diferentes campos de energia de diferentes dimensões sutis da existência, como foi encontrado e descrito por James, na sua pesquisa sobre a variedade de experiências religiosas. A experiência sexual e a experiência espiritual profunda estavam profundamente conectadas, como já haviam percebido muitos na tradição bio-espiritual, testemunhando contra a profunda depreciação da sexualidade nas tradições religiosas distorcidas e contra a profunda depreciação da espiritualidade nas tradições científicas.

Parte III: Entre psicologia e espiritualidade

 Psicologia Humanista

A psicologia humanista se desenvolveu nos anos cinquenta, fundamentada parcialmente nas teorias de interação grupal desenvolvidas a partir de Kurt Lewin e da psicoterapia Gestaltica de Fritz Perls, parcialmente inspirada pela fundação do Instituto Esalen na Califórnia e parcialmente no trabalho de Abraham Maslow(1952). Maslow postulava uma hierarquia de necessidades básicas, desde as necessidades ligadas a sobrevivência imediata, indo através das necessidades emocionais até as necessidades espirituais. Um dos conceitos chaves de Maslow foi o conceito de “experiência de pico”, como uma experiência que levava a pessoa a um contato muito profundo consigo, com o outro ou com a natureza. O movimento humanista era de uma forma geral aberto a espiritualidade. Maslow se referia a este movimento como a terceira força na psicologia, a partir do que surgiu na década dos sessenta a chamada “quarta força”, a psicologia transpessoal, criada por Abraham Maslow e Anthony Sutich.

Psicologia transpessoal

Na Associação European Association for Psicotherapy Transpesrsonal, a psicoterapia transpessoal é reconhecida como a sexta de nove tendências principais. A psicoterapia transpessoal tem outras raízes além de ter se inspirado na psicologia humanística. Uma destas raízes é claramente o trabalho de Jung a que nos referimos anteriormente. Outra raiz vamos encontrar mais atrás no trabalho de Karlfried von Durkheim, o fundador da terapia iniciática (1973). Durkheim estudou com Heidegger e mais tarde no Japão com os zen budistas. Ele desenvolveu sua compreensão da dupla herança do homem, desde um self menor, ou o mundo do ego até o Self Maior. Durkheim fundou uma comunidade em Todtmoos na Floresta negra na Alemanha. Um de seus discípulos foi Stanley Keleman, citado anteriormente.

Uma terceira raiz da psicoterapia transpessoal encontramos no trabalho do psiquiatra tcheco Stanislav Grof (1985), cujo principal foco foi a psicologia peri-natal; ele tornou-se interessado em estados alterados de consciência que se apresentavam em estados de regressão profunda. Seu trabalho com terapia holotrópica é baseado num modelo multi-dimensional do homem aberto a níveis trans-egóicos de experiência. Nos últimos anos algumas pessoas da comunidade de Durkheim demonstraram considerável interesse em seu trabalho.

A quarta raiz da psicoterapia transpessoal é o trabalho de Roberto Assagioli na Itália (1965). Assagioli saiu da psicanálise na direção do que chamou psicossíntese, uma forma de integrar vários níveis do ser humano. A psicossintese embora desenvolva muitos insights importantes sobre a integração da espiritualidade na vida cotidiana, tende a ignorar e a não incluir insights psicodinâmicos sobre problemas humanos. Desenvolvimentos recentes feitos por John Firman na psicossintese, buscam reintegrar os melhores insights da psicossintese sobre aspectos espirituais do homem com a compreensão alcançada pela psicodinâmica e a teoria das relações objetais dos problemas humanos.

No início dos anos cinquenta, Assagioli encontrou-se com Francis Mott, (1948) um líder da psicologia configuracional na Inglaterra, que trabalhava na tradição de Otto Rank com insights da psicologia peri-natal e embriologia. Mott perguntou a Assagioli que tipo de trabalho ele fazia.” Eu faço psicossíntese”. Mott replicou dando uma visão geral do seu trabalho. Que tipo de trabalho você faz, perguntou Assagioli a Mott. Mott respondeu “Eu pratico Biossintese”. Biossintese foi o nome usado por Mott para descrever sua compreensão única da origem embriológica de muitos aspectos do comportamento humano. Eu adotei o seu termo “Biossíntese” para nomear a forma peculiar de psicoterapia corporal espiritual desenvolvida por Silvia Specht Boadella e por mim no último quarto do século, depois que Mott morreu e não deixou sucessores (Boadella, 1987).

Uma direção diferente dentro da Psicologia Transpessoal foi dada por Ken Wilber, (1985), que buscou a integração de muitas linhas diferentes de desenvolvimento nas áreas psicossocial, filosófica e espiritual. Wilber foi influenciado por Jean Gebser (1985), o filósofo suíço que tinha uma visão de que a cultura humana desenvolvia-se através de estágios na direção de uma consciência mais holística e ecoespiritual. O trabalho sistemático e rigoroso de Wilber na busca da integração de diferentes fontes é uma das maiores realizações do século vinte. As críticas feitas por Michael Washburn (1995) à abordagem de Wilber e as repostas que foram dadas às mesmas serão o tema de uma seção separada deste artigo (veja abaixo sob o nome de Psicologia Integral).

Adrian van Kaam do Institute of Formative Spirituality na Universidade de Duquesnes homenageia as realizações alcançadas pelas psicologias humanística e transpessoal, mas em sua opinião elas se desviaram da espiritualidade verdadeira na sua tentativa de definir a espiritualidade a partir de princípios psicológicos racionais, ao invés de enraizá-las nos ensinamentos fundamentais das maiores tradições espirituais. Uma das questões chaves parece ser se as psicologias transpessoais desenvolveram uma metodologia prática que capacite as pessoas a desenvolver conato com sua própria espiritualidade ou não e como esta metodologia se compararia com metodologias disponíveis dentro das tradições espirituais.

Imune a estas críticas estão as modalidades terapêuticas desenvolvidas dentro de algumas das maiores tradições religiosas. Já me referi ao trabalho de Frank Lake dentro da tradição cristã. A terapia dialógica do encontro de Martin Buber (1958) com suas raízes na cultura Hassídica do Judaísmo; o enfoque da psicoterapia corporal de Almaas na California, (1996), tem raízes profundas na essência das tradições do Sufismo. A terapia iniciática de Durkheim por sua vez tem raízes na longa tradição zen do Japão.

Um dos desenvolvimentos mais interessantes deste último quarto do século, tem sido a aplicação dos insights do Budismo Tibetano ao processo psicoterápico, e as tentativas de traduzir estes insights em forma compreensível ao Ocidente. Na Europa, é muito importante o trabalho de Tarab Tulku, diretor do Tibetan Studies Departament na Universidade de Copenhagen e diretor dos Institutos Tarab Ladrang na Dinamarca, França, Bélgica, Alemanha e Áustria. Ele deu uma conferência no World Congress of Psychotherapy em Viena em 1996 sobre abordagens espirituais e psicoterapia. (Tulka,1996).  Lene Handberg, uma colega de Tarab Tulku, está atualmente engajada em uma pesquisa comparativa entre Budismo e os princípios da psicoterapia ocidental na Universidade de Copenhagen.

Do outro lado do Atlântico um interesse semelhante em psicoterapia tem sido desenvolvido por Tenzin Wangyal (19930, no Ligmincha Institut for the Preservation of Religion and Culture, em Charlottesville, Virginia, EUA. Encontra-se além dos objetivos deste trabalho ser mais especifico sobre as formas Tibetanas de psicoterapia.

A psicologia cognitiva e existencial

A psicologia cognitiva, juntamente com o Behaviorismo, é normalmente conhecida como parte da segunda força em psicologia; esta não tem nenhuma relação especifica com a espiritualidade. Contudo as ciências cognitivas é um campo interdisciplinar que faz interface com áreas em desenvolvimento da pesquisa da consciência. Uma das maiores figuras deste campo é o biólogo chileno, Francisco Varela, ganhador do Prêmio Nobel, e seus colaboradores Eleanor Rosch e Evan Thompson (Varela et. al., 1991).”

Varela descreve a natureza interdisciplinar da ciência cognitiva e os estudos da consciência, abarcando especialidades das neurociências e da física quântica da mente, através da psicologia cognitiva e da psicodinâmica até a fenomenologia, epistemologia, psicolinguística e estudos das tradições contemplativas. Varela é budista e se inspira na tradição da psicologia budista de mais de dois mil e quinhentos anos para iluminar seus insights.

Clamando por uma “transformação corporificada” da consciência, estes autores enfatizam a importância da cognição ordenada como uma forma de conhecimento ativo que integra a compreensão neuro científica do comportamento humano com a experiência direta da vida, associada com a autorreflexão pragmática enraizada na tradição da consciência espiritual. O potencial transformador existente dentro da reflexão pessoal contém um elemento meditativo cuja finalidade é aprofundar a consciência interpessoal e a consciência global e um chamado para a corporificação da psicoterapia, através da conexão da consciência reflexiva com os fundamentos do desenvolvimento espiritual nos níveis sensório-motor, somático emocional, interacional e imaginário da consciência.

O caminho transformador visualizado por Varela e seus colaboradores para superar os problemas planetários é um caminho de ação compassiva inteligente: é um caminho que combina compreensão clara com contato com sentimentos e comportamento consciente.

Varela foi professor no Summer Science Programme no Instituto Naropa em Boulder, Colorado. Seu trabalho tinha o apoio do fundo de pesquisa da Stiftung zur Forderung der Philosophie. Este trabalho foi desenvolvido na Ecole Polytechnique em Paris e apresentado em uma conferência organizada pelo Lindisfarne Programme for Biology, Cognition and  Ethics nos EUA que também ajudava com recursos. A medida que este trabalho se desenvolveu construindo uma ponte maior entre a psicologia cognitiva e os insights espirituais, recebeu também recursos do Centre de Recherche Scientifique em Paris. A colaboração de Eva Thompsom no projeto teve o suporte do Departament of Comparative Phylosophy da Universidade de Amherst e do Social Sciences and Humanistic Research  Council of Canada, do Departament de Philosophy da Universidade de Toronto e do Centre for Cognitive Studies na Universidade de Tufts, nos EUA. A participação de Eleanor Rosch foi apoiada pelo Cognitive Science Programme na Universidade da California em Berkeley. Esta lista impressionante de suporte cientifico base da construção de uma ponte entre a espiritualidade e as ciências cognitivas pode tranquilizar aqueles que confundem espiritualidade com ilusões esotéricas.

Varela e seus colaboradores defendem firmemente a tradição trans-dualistica da escola de Filosofia de Kyoto, representada por Keiji Nishitani (1983). Nishitani é professor de Filosofia na tradição Zen Budista de Nagarjuna, como seu professor Nishida. Nishida (1987), foi o fundador da tradição filosófica de Kyoto que busca uma integração da compreensão filosófica oriental e ocidental da corporificação da realidade. Da mesma forma que Varela manteve-se na tradição fenomenológica de Husserl e Merleau Ponty, Nishitani foi um aluno direto de Martin Heidegger e indiretamente de Nietzche.

Como Varela enfatizou a exagerada natureza teórica da psicologia fenomenológica, (mesmo quando fala de corporificação ela não envolve uma prática de corporificação), também Nishitani foi além do niilismo e da falta de grounding do existencialismo para a compreensão de um nível mais profundo de realização que transcende a dualidade sujeito-objeto.  Aqui o enfoque transformador de Nishitani faz muitas conexões com a filosofia do organismo, originada em Goethe e Schelling, a quem ele muito admira, continuando com Bergson e na filosofia processual do cientista inglês Alfred North Whithead (1978).

A ponte brilhante construída por Nishitani entre a Ciência Ocidental (objetivismo) e a espiritualidade Oriental (subjetivismo) mostra a filosofia do organismo que une as áreas cientificas, éticas, religiosas e políticas da experiência humana de uma forma surpreendente. A transcendência da cisão entre o reino “eco” do ambiente externo (que está ameaçado de desertificação) e o reino do “ego” da dinâmica de caráter egoísta (que Wilhelm Reich chamou de deserto interior), também conecta o trabalho de Nishitani de uma forma muito próxima ao enfoque de Ken Wilber, ao qual retornaremos mais tarde. O trabalho de Nishitani tem o suporte do Japanese Ministry of Education Aid Grant for Scientific Research Results e do Departamento de Filosofia da Universidade de Kyoto e do Departamento de Filosofia da Universidade de Otani, Kyoto.

Compreensão Sistêmica e psicologia Cibernética

Os sistemas de pensamento modernos se originaram no trabalho de Ludwig Bertalanffy, que se inspirou nas ideias holísticas presentes na filosofia de Bergson e Whitehead. Bertalanffy, por sua vez, exerceu uma grande influência em Norbert Wiener, o fundador da ciência da Cibernética. A conexões entre estas disciplinas notáveis foram muito bem descritas por Fridjhof Capra (1996). Um dos grandes pensadores sobre sistemas dentro do campo da psicoterapia é o alemão Gunter Schiepeck, (1996), ele propôs que os diferentes níveis de organização da experiência humana podem ser visualizados como uma hierarquia vertical de camadas de ordens, através das quais a informação passa. Na Alemanha, uma visão semelhante foi desenvolvida pelo pai da medicina psicossomática, Thure Von Uexkull (1994). O psicólogo holandês Douwe Tiemersma (1989), estudou os esquemas corporais e a imagem corporal tanto da perspectiva fenomenológica como experimental e relaciona estas dimensões da experiência verticalmente organizadas, ao conceito dos corpos sutis da tradição espiritual ocidental (veja abaixo).

O National Institute of Health de Bethesda em Maryland, que é ligado a Organização Mundial de Saúde, organizou um escritório de Medicina Alternativa, para estimular o estudo de formas alternativas de tratamento médico e healing. Este escritório estabeleceu ligações próximas com o Institute for the study of Subtle Energy and Energy Medicine (ISSSEEM), nos EUA, que vem já por muitos anos estudando os sistemas interconectados do organismo humano, personalidade e consciência. Os estudos desse Instituto confirmam os ensinamentos milenares tradicionais do Ocidente e Oriente sobre a existência dos campos sutis de energia do corpo.  O professor holandês Jan Portman, na Universidade de Amsterdã (1978), fez um estudo de seis volumes sobre a história do corpo sutil nos últimos cinco mil anos, em todos os continentes. Os achados do Instituto de Medicina Energética são matéria de um outro artigo sobre “Subtle bodies and organising fields”. Nas páginas do jornal do ISSSEEM há um debate considerável sobre se os chamados campos “energéticos” são físicos ou para-físicos, ou são níveis de informação não físicos (Green, et al, 1992). A First International Conference on the Psychology of Consciousness, aconteceu em 1997 em Connecticut, organizada pelo National Institute for the Clinical Aplication of Behavioural Medicina. A conferencia apresentou “achados pioneiros na aplicação clínica da intenção, intuição, consciência e a integração da espiritualidade”. O conselho, que inclui especialistas das Universidades de Arkansas, Massachusetts, Stanford e Manchester escreveu que “as novas ciências têm o potencial de trazer para as profissões caminhos novos e revigorantes de olhar para mudança. As noções de Bohm sobre a ordem implicada, as ideias de Sheldrake sobre campos morfogenéticos, os conceitos de Dossey sobre mente não-localizada, quando aplicados a dinâmica da mudança humana trazem uma mudança sutil mas fundamental em nossa compreensão de quem somos, como mudamos e o mecanismo pelo qual isto ocorre”.

Ole Vedfeldt, (1996) um psicólogo dinamarquês, vê o campo total da consciência e experiência humana em termos de níveis interacionais de informação existindo em uma ordem hierárquica, nos quais, níveis mais altos de organização não podem ser reduzidos aos níveis mais baixos. Há um fluxo constante de informação passando entre níveis inferiores e superiores. Esta visão é consistente com muitos princípios da teoria dos sistemas e também corresponde a compreensão desenvolvida na psicobiologia do sistema imunológico, que será considerado mais tarde neste artigo. No modelo de Vedfeldt, como no modelo de Thure von Uwexkull, a dimensão espiritual da experiência é uma parte natural da organização do ser humano, mas funciona no nível mais alto desta organização. O enfoque psicológico sistêmico tem muitas áreas de sobreposição com a Psicologia do Spectrum de Ken Wilber, a qual retornarei em breve.

Psicologia Contemplativa

A Psicologia Contemplativa é definida por Han de Vit, (1991), professor de Psicologia teorética, Universidade Livre em Amsterdã, como a psicologia mais antiga, desde que tem sido desenvolvida não por praticantes de disciplinas acadêmicas, mas ao contrário, por praticantes inteligentes e sensíveis das tradições contemplativas e espirituais, quer ligados ou não a formações religiosas específicas. A psicologia contemplativa é uma psicologia espiritual do desenvolvimento, com prescrições especificas de práticas que são recomendadas para alcançar este desenvolvimento. De Vit utiliza um modelo tripartite para descrever os aspectos dos estágios de desenvolvimento. Ele delineia três categorias de pensamento, ato e ação como base para organizar uma psicologia contemplativa da mente, da comunicação e do comportamento.

Como na Biossintese, esta divisão tripartite, com suas raízes na psicologia Budista e Pitagórica, define três divisões das principais correntes da psicologia: os domínios da psicologia cognitiva, psicodinâmica e behaviorista. De Vit como Adrian van Kaam, com sua ciência formativa da espiritualidade, e outros como Jan Poortman e Douwe Tiemersma, são líderes do que podemos chamar a escola holandesa da espiritualidade. Como Varela, De Vit desenvolveu muito de suas ideias no Instituto Naropa em Boulder, Colorado. De Vit contrasta o aspecto objetivo da terceira pessoa em psicologia, como visto por exemplo na psicologia da religião, típico dos estudos universitários, com o aspecto subjetivo da psicologia da primeira pessoa do meditador, ou praticante espiritual. Ele vê a psicologia contemplativa unindo estas duas tradições. A beleza de seu enfoque é que é a aplicação aos ensinamentos e práticas essenciais em todas tradições espirituais formativas sem ser limitado por nenhum dogmatismo associado com a forma exotérica de alguma religião em particular. O desenvolvimento desta forma moderna de psicologia contemplativa tem sido apoiado pelos recursos da Dutch Organization for Pure Scientific Research e pela Fundação Fullbright. O professor Han de Vit torna explícito as conexões entre seu próprio trabalho e a corporificação transformadora de Francisco Varela, como também a psicologia integral de Ken Wilber.

Uma segunda escola de psicologia contemplativa surgiu na Dinamarca, basicamente em torno da psicologia espiritual do auto desenvolvimento ensinada por Robert Moore (Gamborg,1991), um irlandês que durante certo tempo trabalhou na rede dos médicos healers em Londres, antes de mudar-se para Dinamarca em 1973.

A tradição contemplativa de Moore não é vinculada a nenhuma tradição religiosa. É baseada no treinamento sistemático em uma variedade de práticas meditativas interligadas, desenhadas para o praticante dar-se conta de estados de consciência de diferentes dimensões do seu corpo físico e dos seus campos de energia. Considero o trabalho de Moore um dos mais amplos e sérios de todas tentativas ocidentais de enraizar a espiritualidade na vida cotidiana, tema que tem provocado altos níveis de debates entre professores budistas, incluindo o Dalai Lama, embora o background de Moore seja completamente ocidental. O trabalho que ele ensina sobre a integração psicossomática, visto sob a luz da consciência meditativa, abrange insights sobre o fluxo de informação dentro do sistema da energia sutil, que tem aspectos comuns com o trabalho desenvolvido pelo Institute for the Study of Subtle Energy and Energy Medicine, como descrevi acima.

Jes Bertelsen(1978-1983), um professor de psicologia da Universidade de Aarhus, estudou com Robert Moore, e diferentemente de Moore que não publicou livros sobre seus ensinamentos, Bertelsen publicou uma série de livros onde discorre sobre sua visão da psicologia profunda dentro da tradição contemplativa. Bertelsen tem um background em psicologia transpessoal, com uma tese sobre o processo de individuação no sentido Junguiano e fez muitas conexões com outras tradições contemplativas em sua exploração dos muitos caminhos entre energia e consciência.

O trabalho de Moore foi objeto de um projeto de pesquisa organizado pelo Institute for Creativity and Culture, na Universidade de Aarhus, sob a coordenação do Dr. Hans Fink, e também foi uma grande inspiração para a psicologia cibernética de Ole Vedfelt, que descrevi acima. Depois do trabalho em psicoterapia corporal de Wilhelm Reich e seus seguidores, e do trabalho de Stanley Keleman e da Biossíntese, o trabalho de Moore tem sido definido como uma forma mais ampla de psicoterapia corporal, uma psicoterapia corporal espiritual, em razão do nível de profundidade com que capacita os estudantes a fazer contato com sua espiritualidade em uma forma não sensacionalista, e também pelo suporte  enorme que dá para fazer contato com as qualidades essenciais e sua manifestação na vida cotidiana.

Psicobiologia e Bio-feedback

O trabalho dos primeiros hipnotizadores no último século fez muitas conexões com estados paranormais dos pacientes, como já me referi anteriormente. A segunda metade deste século testemunhou o crescimento da psiconeuroimunologia, uma nova ciência que mostra as conexões transformadoras entre diferentes níveis do corpo, mente e espírito. No nível corporal o sistema imunológico revela a prontidão do corpo para reagir, está relacionado ao nosso estado psicoemocional e pode ser influenciado por nossa habilidade ou não em acessar qualidades tais como a fé ou a vontade de viver. Um paciente com câncer tem um sistema imunológico que não está naturalmente eliminando células malignas porventura existentes, a razão disto em alguns casos está relacionado com ligações ente a sufocação da célula e resignação emocional ou depressão como visto no trabalho de Wilhelm Reich. Esta resignação emocional, por sua vez, pode estar relacionada a uma perda de um sentido de futuro, ou um sentido de significado na vida. O trabalho de Carl e Stephanie Simonton (1980) mostrou que em 40 por cento dos pacientes com câncer, é possível através de visualizações e imaginação positivas contrabalançar o processo cancerígeno. O trabalho de Simonton, apresentado no 2º Congresso da série “Visions of the Human Future” em Bremen em 1995, está profundamente relacionado a habilidade do terapeuta em contrabalançar fontes e recursos de renovação espiritual no paciente. Desta forma um processo de cura não química pode ser iniciado.

Biofeedback começou como um processo de condicionamento de seres humanos e animais para controlar e portanto regular processos corporais que normalmente não estão sujeitos ao controle voluntário e evoluiu numa direção que suporta o trabalho de Simonton e sugere que através de uma forma de treinamento meditativo para desenvolver a consciência dos processos corporais é possível iniciar tendências curativas que contrabalancem o processo da doença. Esta forma de mostrar o aparente controle da mente sobre a matéria está relacionada a certas práticas yogues que tem sido de especial interesse para os pesquisadores do biofeedback. A yoga é uma forma de treinamento de conscientização psicofísica que surgiu de uma tradição formativa milenar. Uma forma popular deste controle da mente sobre o corpo pode ser vista no caminhar sobre o fogo, onde praticantes demonstram suas habilidades em prevenir que os pés fiquem cheios de bolhas, através do desenvolvimento de estados específicos de consciência meditativa, que tem muito em comum com práticas espirituais, e com atitudes que podem ser aplicadas para dar apoio ao processo de cura. Portanto a pesquisa em biofeedback, que também tem sua origem no behaviorismo, tem uma interface importante com as tradições e práticas espirituais contemplativas. Dr. Med. Daniel Benor, fundador da Doctor-Healer Network na Grã Bretanha, escreveu um livro de quatro volumes sobre Healing Research no qual ele não somente descreve os novos paradigmas bioenergético e psico-espiritual, mas fornece relatórios detalhados de 137 experimentos cientificamente controlados sobre processos de cura da energia sutil em plantas, animais e seres humanos. (Benor, 1992-1993).

No California Pacific Medical Centre em São Francisco, a diretora da unidade de pesquisa psicossocial em Oncologia, Dra. Elisabeth Targ, estudou a cura espiritual em relação a pacientes aidéticos. No Esalen Institute Studies of Exceptional Funcioning, Michael Murphy estudou mais de 1000 investigações sobre a relação entre meditação e reações psicológicas, muitas das quais colaboraram para melhorar o sistema imunológico. David Felton, Presidente do Departamento de Neurobiologia na Universidade de Rochester confirmou que “qualquer atividade que envolva meditação e controle do estado da mente que altere a atividade do hormônio tem o potencial de influenciar o sistema imunológico.”

O jornal da American Medical Association publicou em Maio de 1995 um artigo sobre “Spiritual Aspects of well being considered”, que relatava os resultados de uma conferência médica importante sobre o tema “Spiritual Dimensions in Clinical Research”.

A terapia do movimento e posturas da alma

Rudolf Steiner desenvolveu uma das primeiras dentre as várias terapias do movimento deste século (Mac Dermont, 1987). Steiner se inspirou nas pesquisas de Goethe sobre morfologia e ótica e no trabalho de Carl Gustav Carus (1970) sobre psico- embriologia. Ele tomou o termo “antropologia”, de Ignaz Troxler, (1928), um psicólogo suíço nascido nas últimas décadas do século dezoito, para denominar a forma particular de trabalho que desenvolveu.

Arthur Zajonc (1993) mostrou num estudo fascinante, a longa história da tradição formativa da qual Steiner emergiu. Steiner desenvolveu uma forma particular de movimento “euritimia”, uma prática de movimento cujo objetivo era o reequilíbrio do corpo, sintonização das emoções e revitalização do espirito. Gerda Alexander da Dinamarca desenvolveu sua forma própria de exercícios terapêuticos de movimento que chamou de eutonia. Na Alemanha, um discípulo de Gerda Alexander, Volkmar Glazer aprofundou a fisiologia da eutonia e explorou as relações entre tônus muscular, respiração e intencionalidade. Quando começamos a lidar com a intencionalidade no movimento, que se tornou em si mesmo um rápido campo de pesquisas, a interface com a espiritualidade tornou-se clara. Glaser desenvolveu certos tipos de movimentos que abriam um sentimento que ele chamou de “transensus”, cujo objetivo era estimular os estudantes que o praticavam a ficarem mais intimamente em contato com estados profundos do self e de experiências transcendentes. Em Biossintese, desenvolvemos estas formas de movimento através de um trabalho terapêutico que tem esta qualidade de fazer pontes com outras dimensões e que chamamos de posturas da alma. Tarthang Tulku, da tradição tibetana, do Instituto Nyngma em Berkeley, ensinou um sistema de movimento chamado “Kum Nye” (Tulku 1978), é um tipo de yoga com movimentos suaves que enfatiza a percepção das sensações dentro do movimento e as qualidades espirituais presentes em cada postura.

No Japão temos o exemplo vivo da “dança butoh” desenvolvida por Kazuo Ohno, seu fundador (Viala & Masson-Sessima, 1988). A dança Butoh trabalha também com uma extrema sensibilidade a intencionalidade, ao equilíbrio entre o exterior e o interior, e a habilidade do dançarino de integrar mundos sutis e densos de experiência com a expressão nos movimentos e postura que ele ou ela desenvolve. Sivia Specht Boadella, uma das discípulas de Ohno, desenvolveu a dança Butoh em sua forma particular de movimento terapêutico meditativo, uma dos maiores contribuições e inspiração para o trabalho da Biossíntese nos últimos vinte cinco anos.

Psicoterapia Integrativa e a psicologia Spectrum

O termo Terapia Integrativa pode sugerir um sistema terapêutico criado a partir de muitos componentes. Quando os componentes estão relacionados de forma congruente, de uma maneira consistente, tal integração pode ser muito poderosa e efetiva. Quando não, podemos ser confrontados com uma mistura eclética apresentada por um terapeuta tipo pau para toda obra, mas que não domina nada.

Bastante diferente em sua origem e intenção é a psicologia integral, anteriormente chamada de spectrum psicologia, desenvolvida nos últimos vinte anos por Ken Wilber nos EUA. O modelo de Wilber tem muitas raízes tanto nas tradições formativas ocidentais e orientais, como também na teoria dos sistemas, psicologia do desenvolvimento, sociologia e filosofia. Wilber longe de ser eclético, tece seus ingredientes juntos numa rica tapeçaria, um dos grandiosos trabalhos do século vinte. Em sua trilogia épica sobre o tema do Kosmos, Wilber (1995), cobre toda história da raça humana e o desenvolvimento da cultura humana nos estágios propostos por Jean Gebser, mas indo além deste. Wilber trabalha com a polaridade e dialética entre as influencias das correntes culturais que supervalorizam o espirito, desprezando a matéria e as correntes descendentes de pensamento que supervalorizam a matéria, desprezando o espirito.

O modelo de Wilber não é criado somente intelectualmente mas o fruto de muitos anos de prática meditativa. É claro na sua forma conceitual, vital no imaginário, espiritualmente vivo e politicamente desperto. Ninguém que escreva sobre os contextos culturais da espiritualidade em nenhum continente ou século, pode ignorá-lo. Michael Washburn fez uma crítica ao modelo de Wilber, e esta será matéria de um artigo independente.

Wilber se interessou em construir paralelos entre os achados da física quântica moderna, a biologia mórfica e os ensinamentos dos mestres espirituais. Publicou um livro onde ilustra estes paralelos. Conquanto de acordo com uma compreensão reducionista, o espiritual pode ser reduzido ao psicológico, o psicológico ao neurobiológico e o neurobiológico ao quântico, a holística moderna e o pensamento sistêmico nos oferece uma imagem onde as partículas menores da matéria se dissolvem em ondas de probabilidade, mostrando uma conexão não localizada e em alguns modelos cosmológicos aparecendo em outras hiper dimensões da realidade. A energia em si mesmo parece menos fundamental que a informação. O campo da pesquisa da consciência parece abranger paradoxos e quebra-cabeças na interface entre matéria e mente.

Certamente é notável que algum dos mais importantes físicos deste século tenham se envolvido em debates profundos sobre o significado da realidade com figuras importantes do mundo espiritual e transpessoal. Podemos pensar do intercambio de pensamentos entre Einstein e Rabindranath Tagore (1996), ou do livro de extensos diálogos entre David Bohn e Jiddu Krishnarmurti (1955) ou a fertilização cruzada de insights entre Wolfgang Pauli e Carl Jung (1995), que resultou em um livro que escreveram juntos sobre sincronicidade.

A interface entre espiritualidade e política, independentemente de Wilber, expandiu-se num nível global desde a Unesco Conference of Parliamentary and Spiritual Leaders em 1992, que publicou um manifesto contendo muitos princípios unificadores globais e a condenação da violência utilizada em nome da religião. Desde que deixou o cargo de Presidente da União Soviética, Mikhail Gorbachev (1997) devotou muita energia para dar sustentação ao State of World Forum, que sua Fundação estimulou como um poço de pensamento clamando por valores éticos profundos, estados desenvolvidos de consciência e uma nova compreensão espiritual do significado da civilização em uma tentativa de resolver os maiores problemas do planeta. Wilhelm Reich (1952) escreveu no final de seu livro sobre o assassinato de Cristo “a civilização e a cultura ainda não aconteceram”.

Espiritualidade e Psicoterapia hoje

A espiritualidade é parte dos direitos de nascimento do ser humano e não pertence a nenhuma das tradições formativas nas quais práticas e princípios foram desenvolvidos. Tampouco a espiritualidade pode ser reduzida a métodos psicoterapêuticos. No meu artigo “Qualidade de vida e matriz de transformação”, que foi apresentado no 2º Congresso sobre Visions of the Human Future em Bremen (Boadella ,1988b), descrevi a tendência da psicoterapia a construir uma barreira demasiadamente forte contra as tradições espirituais parcialmente por causa do medo de ser contaminada por associar-se com o esotérico. Como já vimos, no entanto, há uma longa história de atitudes espirituais dentro das principais correntes da psicoterapia e nos anos mais recentes esta reaproximação vem aumentando. Darei alguns exemplos abaixo.

A International General Medical Society for Psychotherapy foi formada em 1935 e mudou seu nome em 1954 para International Federation for Medical Psychotherapay. Em 1991 o nome mudou novamente para International Federation for Psychotherapy. A explicação para isto encontramos da seguinte forma na literatura da Federação:

“O objetivo original da Federação era promover a psicoterapia dentro do campo da medicina. No entanto, com o passar do tempo, a psicoterapia veio a incluir um vasto campo de profissões tanto cientificamente como na prática.”

Em 1993 em Seul na Coreia, a Federação organizou seu 17º Congresso no qual o maior foco foi colocado na relação entre psicoterapia e as maiores tradições espirituais do mundo, incluindo taoísmo, budismo, sufismo, hinduísmo, e dentro do Cristianismo, o aconselhamento pastoral.

O Institut fur Grenzgebiete der Wissenschaft organizou seu 42º Congresso em Innsbruck, também em 1993. Foi organizado pelo psicólogo Dr. Andreas Resch, cujo tema era “The Worlds of the World-builders”. Neste Congresso os paradigmas das principais correntes científicas foram apresentados juntamente com as maiores tradições formativas espirituais. Um dos principais oradores do Congresso foi o Dr.Erwin Nickel (1994), que falou sobre a relação entre o “Humanwissenschaft” da psicoterapia e o “Geisteswissenschaft” das ciências espirituais.

A International Association for Spiritual Psychiatry foi formada em Lyons em 1994. Seus objetivos são descritos da seguinte forma:

“O propósito desta associação é estabelecer as bases de uma medicina psicoespiritual aberta e dinâmica, na qual o sofrimento psicológico e as perturbações psicopatológicas não serão mais separados do contexto do amadurecimento espiritual característico de cada indivíduo. A palavra psiquiatria é utilizada aqui no seu significado etimológico mais nobre, o significado de uma medicina da alma, de uma medicina do espírito”.

Esta Associação, que tem sede em Paris e Jerusalém, já organizou até o momento, três congressos: o primeiro em Lyons, em Março de 1994, sobre “The spiritual approach in Psychotherapy: Meditation and Psycotherapy”. O segundo, em Paris, em 1995, sobre “Psychotherapy and Self-Realization: Ego, Suffering and the End of Suffering”. O terceiro Congresso ocorreu em Montreal em 1996, com o tema: “Spiritual Approaches in Depression: Depresion, Suicide and the Death of the Ego”.

O World Council for Psychotherapy foi criado em Zurique em 1995, e organizou seu primeiro Congresso Mundial em Viena em Julho de 1966. A formação do World Council, oportunizou que pela primeira vez na história da psicoterapia quase todas as principais abordagens da psicoterapia se reunissem oficialmente juntas num espírito de cooperação mais do que conflito e competição. Quatro mil terapeutas de setenta países de diferentes continentes, estiveram presentes no Congresso. Um workshop de dois dias, sobre a Psicoterapia dentro de um contexto espiritual, foi coordenado por Tarab Tulku. Este foi um dentre os vários workshops que antecederam o congresso.

Na abertura oficial do Congresso, o Presidente, Dr. Alfred Pritz, apresentou uma pequena conferência sobre a importância da psicoterapia no mundo atual, nela comentou que um dos maiores problemas que causava sofrimento as pessoas era o desterro espiritual. Foi bastante significante que a conferencia principal foi dada a Viktor Frankel, na época com mais de noventa anos, como uma homenagem ao trabalho de sua vida, significante na defesa do enraizamento de valores e  da essência do significado dentro da psicoterapia. Dr. Pritz enfatizou que a psicoterapia não deveria ser vista como uma profissão eurocêntrica. Ele convidou shamans para estarem presentes, como representantes dos métodos psicoterapêuticos asiáticos, para confirmar as evidencias atuais da relação histórica existente entre shamanismo e psicoterapia como já havia demonstrado Ellenberger. Já comentei anteriormente sobre a importante conferência de Otto Fenichel, o Presidente eleito da International Pssychoanalitic Association, sobre Psychoanalisis and Religion, na qual argumenta que contrariamente as crenças de Freud, as necessidades espirituais não são ilusões.

Eugen Drewerman também deu uma conferência sobre a importância de atitudes espirituais genuínas dentro da psicoterapia e a necessidade de manter limites firmes contra tendências dogmáticas oriundas de lados autoritários dentro dos movimentos religiosos. Dessa forma, o recém criado World Council mostrou abertura para incluir as mais relevantes questões e abordagens espirituais no entendimento psicoterápico.

Eu me tornei um líder no World Council for Psychotherapy’s Working Party no quesito Psicoterapia e Espiritualidade, onde a versão original deste artigo Essência e Ground foi apresentado pela primeira vez em Paris em 1998.

A European Association for Psychotherapy foi formada em 1990, com base na Declaração de Strasboug que considera a psicoterapia como uma profissão altamente qualificada em seu próprio direito e não como um compartimento da medicina ou da psicologia. Congrega mais de 50.000 terapeutas oriundos de mais de 27 países europeus. Em 1996 a Associação organizou um Working Party para explorar a relação entre “Psicoterapia e Espiritualidade”, sob a liderança de Andres Nino, um psicólogo clinico da Arbor Health System, que escreveu um trabalho sobre este tema na Universidade de Harvard, apresentado na 6ª European Conference on Psychology and Religion, na Universidade de Lund na Suécia, com o título “The assessment of spiritual quests in clinical practice”. Andres Nino, escreveu sobre sua visão do tema em um artigo sobre “A Psychological Perspective on Spiritual Concerns during Adulthood”, publicado na revista do HRI Hospital em Brookline, Massachussets (Agosto 1966), como segue:

“Um ponto de partida é a observação de que adultos estão frequentemente envolvidos num processo de busca, avaliação e reconstrução de experiências importantes que aconteceram no decurso de suas vidas. É caracterizado por uma urgência para a introspeção e a formulação de questões que incluem preocupações em relação ao destino pessoal, felicidade, ética, Deus, sofrimento, e morte. Este processo, principalmente orientado na direção de busca de coerência interna e propósito em suas vidas pode ser considerado como parte do “empenho fundamental” da pessoa em busca da realização de valores, ambições e ideais, o que Kohut (1977) e outros identificaram como central para o Self Central (Core Self). Ignorar o papel que a espiritualidade tem nestes processos seria colocar em risco a inteireza de uma intervenção profissional” (Nino, 1996).

A European Association for Body Psychotherapy foi criada em Oslo em 1988 e tem sua sede em Genebra, Suíça. É uma organização que congrega muitas escolas de psicoterapia somática que se expandiram a partir do trabalho de Wilhelm Reich.  As primeiras raízes da psicoterapia corporal estão na síntese psicofísica de Pierre Janet, como mostrei em meu artigo “Awakening sensibility, recovering motility” (Boadella, 1997). Janet também estava aberto ás dimensões espirituais da pessoa e sabemos que isto também é verdadeiro para Wilhelm Reich e Ola Raknes, o fundador da escola Escandinava de Vegetoterapia Caractero-analítica. Não surpreende que muitas das escolas de psicoterapia corporal, dentro da Associação Europeia desenvolveram o seu próprio contato, de alguma ou de outra forma com as tradições, enfatizando a importância de um desenvolvimento espiritual enraizado, realista e não ilusório. No jornal Pulsazione, criado por Dr. Peter Bolen, um dos Presidentes da Associação Europeia, Barbara Jakel escreveu em três partes, um artigo importante sobre “Spiritual Aspects in Body Psychotherapy” (1996).

Nas páginas da edição alemã do International Journal Energy und Character que fundei um quarto de século atrás, pode ser encontrado uma série de ensaios escritos por Margrit Grossman, (1995.1996), uma psicoterapeuta existencial, e por mim mesmo (Boadella, 1995) sobre a relação entre o conceito de essência e existência. Este debate recebeu uma contribuição de Adrian van Kaam (1996) e um artigo mais longo e de grande valor sobre Discovery and Development (Wehowsky,1997-98).

Na forma particular de psicoterapia somática que desenvolvemos nos últimos vinte cinco anos, chamada Biossintese, os aspectos espirituais da terapia estiveram sempre à frente, desde o início, e muitos artigos sobre este tema foram publicados.

Os princípios específicos, as práticas e procedimentos envolvidos em nosso trabalho terapêutico, educacional e formativo serão tema de um artigo sobre Spiritual Grounding in Biosynthesis.

“Este artigo foi publicado pela primeira vez no International Journal of Psychotherapy, Vol.2, Nº 1, Março 1988”.

 

Traduzido do Inglês para fins de estudo por Wilfried Zimmer
E-mail – winzim@terra.com.br

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